sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Sherry...Xerez,Jerez, viva a Andaluzia!!


“Sonhar o sonho impossível
Sofrer a angustia implacável
Pisar onde os bravos não ousam
Reparar o mal irreparável
Amar um amor casto à distância
Enfrentar o inimigo invencível
Tentar quando as forças se esvaem
Alcançar a estrela inatingível
Essa é a minha busca”

Dom Quixote de La Mancha




O clássico de Miguel de Cervantes y Saavedra ( 1547- 1616) foi ambientado na região de La Mancha mas bem que poderia ser na Andaluzia, na minha visão os versos do cavalheiro andante refletem a obstinação e a dedicação do produtor andaluz na sua luta para manter vivo o Jerez, um vinho de mais de 2 mil anos!!!
“Aceitunas, anchoas, morrón, jamón serrano, y una copita de Fino Seco”, uma mesa com “Tapas e Jerez”, um hábito cada vez mais distante até para próprios espanhóis. ( nada há ver com a crise atual )
Os ingleses adoram ( ou adoravam ) um Jerez, ou melhor um Sherry como eles preferem chamar, e estão diretamente ligados às origens destes vinhos fortificados ( + alcoólicos)
No eterno morde e assopra entre ingleses e franceses, os primeiros foram buscar fontes alternativas aos claretes de Bordeaux para continuar desfrutando de bons goles ( e que goles!) e acabaram se encantando com os fortificados de Portugal (Porto) e Espanha ( Jerez).
Aromas de nozes e amêndoas, um pouco de menta e ervas frescas, envolto em um ar marinho com toques de salinidade, certamente um inglês declamando para sua amada taça de um Jerez Fino Seco minutos antes de degustá-lo até o ultimo gole....
Há muitos tipos de vinhos de Jerez, o Fino ( Jerez de la Frontera) e o Manzanilla ( Sanlúcar de Barrameda) são mais secos e leves, e sua “crianza” depende enormemente da formação da “flor” um manto de leveduras que protege o vinho da oxidação pelo oxigênio.
Quando por inúmeras razões o véu de leveduras não se forma, o vinho oxida dentro do tonel, muda de cor, de aroma de gosto, nasce o Jerez Oloroso !
As uvas são sempre brancas, e predominantemente a Palomino, uma cepa que não teria razão de ser se não fosse para gerar os Jerez, uma obra de arte dos artesãos espanhóis
Quando estes utilizam a Pedro Ximenez (PX) o resultado é diferente, talvez o vinho mais doce que existe, uma multiplicidade de aromas e sabores, figos secos, alcaçuz,caramelo queimado, uvas passas, ameixa-preta....., uma combinação perfeita para um creme inglês, ou um manjar branco!!!
E a “crianza” destes vinhos então, todo Jerez obedece ao sistema de Solera para amadurecer antes de ser engarrafado, uma pilha de tonéis, o “solera” na base junto ao chão e as linhas de “criadeiras” uma por cima da outra, o vinho pronto que você vai beber sai da solera, só um pouco, o resto continua lá, o espaço então é completado pelo vinho da primeira linha de criadeira, e esta recebe a mesma quantidade da segunda, que por sua vez recebe da terceira, ....o movimento de “doar” e “receber” na mesma proporção pode se estender por inúmeras linhas de criadeiras ( 14!), um sistema que aumenta muito a idade média do vinho em todo o sistema, e garante a manutenção do estilo a cada ano em que uma parte dele é engarrafado e oferecido à você, não se acanhe então, vai lá, experimente, compre um, quem sabe você não se torna um admirador do Jerez, bem que ele precisa........
A grande ironia disso tudo é a seguinte, justamente o álcool extra dos generosos e fortificados, usado para preservar os vinhos por mais tempo, aumentando as possibilidades de chegarem até os exigentes ingleses em boas condições, é hoje o maior obstáculo para o crescimento e até a sobrevivência destes vinhos.
Ao contrário dos antigos bebedores, o apreciador dos dias de hoje tem consciência sobre a necessidade de consumir pouco álcool, preferindo optar por vinhos tranqüilos com menor teor alcoólico.
O Douro terra dos Portos tem a alternativa da produção de Tintos Tranqüilos de ótima qualidade, o clima ajuda, já não é bem o caso da tórrida Andaluzia onde as uvas literalmente “cozinham no pé”
O Jerez é o grande vinho da Andaluzia, quem sabe ainda até da Espanha, mas ao que parece o desenvolvimento do vinho neste país parece seguir outra direção.....rumo ao norte, mais um desafio para o andaluz, com a inspiração de Dom Quixote ele acredita que vai vencer mais uma vez................

“Nunc est bibendum”, ..”alcançar a estrela inatingível, esta é a minha busca”, Dom Quixote
Até breve, Bacco a seu dispor

Thanks, Viotti, Jancis, Johnson, Dominé, Larousse.....foto: Coleção Folha-O mundo do Vinho





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